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| O Poderoso Chefão: Parte II | 40 Anos

Posted in Clássicos, Críticas de 2014, Drama with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 20 de setembro de 2014 by Lucas Nascimento

5.0

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Gerações: Al Pacino como Michael Corleone e Robert De Niro como seu pai, Vito

Poucas continuações têm o impacto de O Poderoso Chefão: Parte II. Aliás, pouquíssimos filmes são complexos, ricos e completos como O Poderoso Chefão Parte II, uma obra densa e que traz em cada frame de seus 200 minutos uma justificativa para que seja considerado um dos melhores da História da Cinema, e que Francis Ford Coppola é um gênio como poucos.

Mais uma vez assinada por Coppola e o autor Mario Puzo, a trama aqui se divide para mostrar dois períodos distintos: de um lado, temos a continuação direta aos eventos do original, trazend0 Michael (Al Pacino) cada vez mais poderoso como o Padrinho da família Corleone, precisando arriscar um valioso acordo quando sofre um violento atentado que revela a existência deu um traidor em sua organização. Do outro, vemos a humilde origem de Vito Corleone (Robert De Niro) como um imigrante da Sicília, e os pequenos passos que vai dando para montar seu império mafioso em Nova York.

Um dos fatores centrais para o brilhantismo de O Poderoso Chefão: Parte II reside na audaciosa decisão de Coppola em fazer não apenas uma sequência, mas também uma prequela, que, mesmo jamais conversando diretamente entre si (o que seria impossível, claro), servem para definir e contrastar os personagens que as protagonizam. Tanto pela escala quanto pelo maravilhoso trabalho de design de produção, não seria um absurdo dizer que são na verdade dois filmes – de época – diferentes costurados entre si, um mérito todo da primorosa montagem de Barry Malkin, Richard Marks e Peter Zinner, trinca que divide bem o ritmo das narrativas e as une com transições belíssimas, sempre provocando o efeito de que pai e filho “se encaram” durante a fusão das cenas.

Tal estrutura, nos permite estudar o quão diferentes são Michael e Vito.

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Vito e os alencares da Família Corleone

Em um dos flashbacks, Vito encara imóvel o sofrimento de seu filho diante de uma pneumonia. Quase escondendo o rosto nas mãos ao mesmo tempo em que é incapaz de fazer algo para socorrê-lo ou mesmo segurar suas lágrimas (em uma atuação sutil e contida de De Niro), Coppola já estabelece de forma belíssima e de partir o coração os motivos que levam o personagem a agir ilicitamente, e que também justificam a ação violenta que Vito será forçado a tomar a seguir. E mesmo depois do brutal assassinato de Don Fanucci (uma cena magistral que por si só merece uma análise isolada), o diretor nos faz lembrar o que move Vito ao mostrá-lo caminhando pela multidão por um longo plano, até encontrar sua família e carinhosamente se juntar a ela; abraçando o recém-nascido Michael, e praticamente falando ao espectador que é tudo pela família. Cinema puro, onde as imagens transmitem muito mais do que o que se vê.

Já Michael revela-se sedento por poder, ainda que também aja para proteger sua família, ainda que aquela formada por mafiosos aparente lhe interessar mais. Mesmo que eventualmente se renda a instintos sombrios e imperdoáveis, Michael é também vítima do seu tempo, um que é muito mais complexo e sujo do que aquele mais ingênuo e menos organizado habitado por Vito, 40 anos atrás. Eu me pergunto se Vito seria capaz de manter seu negócio próspero durante a Guerra Fria, e também mantendo sua posição contra o tráfico de drogas.“Não é fácil ser o filho”, diz Michael para seu irmão Fredo (John Cazale) em certo ponto. Até sob as lentes do diretor de fotografia Gordon Willis, Michael é um ser humano muito mais sombrio, sempre banhando-o com escuridão.

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Michael enfrenta as acusações da Justiça Americana

Na pele das figuras opostas, temos um intenso Al Pacino e um cuidadoso Robert De Niro. Pacino impressiona com a quantidade de emoções que consegue transmitir ao mesmo tempo, como se Michael estivesse constantemente prestes a explodir; e quando o faz, tal como na brutal discussão com sua esposa Kay (Diane Keaton, coadjuvante de luxo), vemos tudo o que o ator é capaz de fazer. Já De Niro é eficaz ao preservar os maneirismos e trajetos do Vito de Marlon Brando no original, mas tem a oportunidade de tomar o personagem para si ao explorar ainda mais a paixão deste por sua família – com jestos simples, como aquele analisado alguns parágrafos acima – e divertir-se com pequenos momentos que antecipam quem este irá se tornar: como não se arrepiar na primeira vez em que Vito solta o icônico “farei uma oferta que ele não vai recusar?”.

Claro que além dos dois, temos um elenco coadjuvante sobrenatural. Além dos retornos de Robert Duvall, John Cazale, Diane Keaton e Talia Shire, temos a valiosa adição de Michael V. Gazzo como Frank Pantangeli, divertido e escandaloso mafioso italiano que diversas vezes surge como um bem vindo alívio cômico e o veterano diretor do Actor’s Studio Lee Strasberg, um dos responsáveis pela proliferação do Método Stanislavski nos EUA, na pele do gângster Hyman Roth, que já impressiona pela fortíssima presença de cena. Outro importante “coadjuvante” que sempre ameaça tomar a produção para si é o fantástico trabalho de Nino Rota e Carmine Coppola na trilha sonora original, que adota o tema icônico do primeiro filme quase como um hino religioso, fornecendo ainda mais impacto a cenas operáticas.

Eu poderia passar horas falando sobre O Poderoso Chefão: Parte II e as palavras continuariam a sair sem interrupção. O filme de Francis Ford Coppola é um grande clássico que explora com maestria todas as ferramentas únicas que a Sétima Arte disponibiliza, resultando em algo verdadeiramente único. Se é ou não superior ao primeiro filme é uma questão de preferência, mas na minha humilde opinião é facilmente um dos melhores filmes de todos os tempos.